FALA, COXAnauta!
Eu era um garoto que dividia meu tempo entre revistas de mulher pelada e revistas/jornais/álbuns de figurinhas e qualquer outra publicação que envolvesse o Coritiba. Comprava tudo. Tribuna, Diário, Gazeta, Placar. Quando tinha pôster na página central da placar então, eu ficava dias sem dormir de tão ansioso.
Lembro que, certa vez, enfrentamos o Colorado no Couto e alguns jogadores como Toby, Lela e o goleiro Jairo não entraram em campo. Eis que, pra minha surpresa, eles aparecem na mauá, no meio dos torcedores, pra assistirem o jogo. Meu coração veio à boca. Eu não imaginava que eles fossem pessoas normais. Pra mim eles eram super heróis e, naquele instante era exatamente assim que eu me sentia: perto dos meus heróis. Falei com o Jairo. Ele me deu um autógrafo. O Lela e o Toby também. Nem prestei muita atenção no jogo. Eu estava emocionadíssimo por ter a chance de assistir uma partida de futebol ao lado do Lela. Imagina!? O Lela ali, bem pertinho. Eu tinha certeza absoluta. Não havia ninguém no mundo que amasse tanto o Coritiba quanto eu. E o mais legal é que tinha um monte de gente que pensava assim também.
Pois bem. O campeonato brasileiro do ano seguinte (1985) começou com duas vitórias em cima de duas grandes equipes: São Paulo com Silas, Muller e Careca e Cruzeiro do craque Tostão (esse mesmo!). O time vinha de uma bela campanha em 84 e tinha uma boa base. Mas a torcida não falava em título. Falava em boa campanha apenas.
No contra o Bahia, ao chegar na Fonte Nova, a delegação deu de cara com um monte de macumba no vestiário. Galinha preta, velas de tudo é que cor. Se deu certo ou não, a verdade é que o time perdeu o jogo. E perdeu pro Vasco também: 3 x 0.
O empate com o Goiás colocou um ponto final na participação do Dino Sani nessa história. Viria pro Alto da Glória um técnico bicampeão brasileiro, um cara de responsa. Seu nome? Ênio Andrade. Ali começava a mudar a história do futebol paranaense pra sempre. Logo no jogo de estreia, Seu Ênio calou o Brasil ao vencer o todo poderoso Flamengo, em pleno Maracanã, por 1 x 0, gol antológico do Marildo.
A campanha seguiu com altos e baixos, até que chegou o famoso jogo contra o Santos. Se vencesse, estaria classificado automaticamente para a segunda fase, pois seria o campeão do segundo turno. Se empatasse iria depender do resultado do Fluminense, que enfrentava o Bahia na mesma hora. Vavá abriu o placar com um golaço de falta e tudo caminhava tranquilamente para a conquista da vaga. Porém, um zé ruela lá empatou de cabeça e o que era um jogo tranquilo virou um drama histórico. Os minutos voavam e aquele gol não saía. O estádio inteiro em pé. O grito de Coooooxa Cooooxa era incansável. Os jogadores corriam por dois. A apreensão era muito grande. Tinha gente chorando. Gente tremendo. Gente roendo unhas. E o placar anunciou o fim do jogo no Rio de Janeiro:
"A Eletrônica Modelo, um modelo de eletrônica, informa: jogo encerrado no Rio de Janeiro. Fluminense 2, Bahia, 1."
Ai, meu Deus. Fodeu tudo. Vamos gritar mais alto. Esse gol vai ter que sair. Até que, aos 44 minutos, Lombardi Junior narrou mais ou menos assim:
"44 minutos tempo final, Coritiba foi com Dida. Meteu enfiado na cara do gol. A bola sobrou pra Marco Aurélio, vai sair o gol do Coritiba, Lela disparooooooou (ouve-se uma explosão no estádio. Uma explosão de alegria impressionante).
GOOOOOOOOOOOOOOOOOOOOLLLLLL. Desarmada toda a armação que fizeram pra cima do Coritiba. Contra tudo e contra todos. Coritiba está na próxima fase do Campeonato Brasileiro.
Eu lembro que tinha um tiozinho na minha frente. Eu subi nas costas dele e dei uns 15 beijos na careca do infeliz. Ele apenas pulava e sorria, feliz da vida. Era muita alegria pra um coração adolescente como o meu. Lágrimas rolavam pelos rostos. Depois daquele jogo eu tinha certeza absoluta que o campeonato já tinha um dono. A taça seria do Coxa, com certeza.
Na segunda fase, nada de sustos. Ganhamos do Joinvile e do Corinthians. Empatamos as duas com o Sport e só perdemos pro Corinthians em São Paulo. Classificamos para as semifinais. Faltavam apenas dois jogos para a tão sonhada vaga na libertadores. E três jogos para a taça.
O primeiro jogo contra o Galo, que já posava de campeão, com foto oficial e tudo mais, foi um verdadeiro teste pra cardíacos. Eles tinham o falecido ponta esquerda Edivaldo que era atentado demais. E tivemos que jogar com alguns reservas, já que muita gente estava suspensa. O Lela e o Rafael não jogaram. O Jairo entrou e pegou até pensamento. O Galo tinha um timaço, mas a força defensiva do Coritiba era algo inacreditável. Ninguém passava. Os três volantes marcavam muito; os dois laterais pouco subiam e a zaga era muito firme. Sem contar que lá sob os três paus tinha verdadeiros monstros (Jairo e Rafael Cammarota). Vencemos por 1 x 0, gol do zagueiro Heraldo. A vantagem dos dois empates estava quebrada. Porém, todo mundo ficou com o cu na mão. Afinal, iríamos enfrentar o Galo num Mineirão lotado e a vantagem do empate não era capaz de deixar a torcida tranquila. E dê-lhe sal grosso e outras mandingas pra espantar o mau agouro. Aquele Osvaldo Sarti e o Feiticeiro eram muito divertidos.
O jogo em Belo Horizonte foi exatamente como todos previam: o Galo atacando e o Coritiba se defendendo. Foram raras as vezes que passamos do meio de campo. A ideia era se fechar e não dar chances pros mineiros. Foi um Deus nos acuda durante os 90 minutos. O tempo não passava. O relógio do juíz tava parado. Que agonia! Mas depois de muito sofrimento, finalmente a vaga na final e na libertadores estavam garantidas. Eu tomei um porre de três dias pra comemorar. Nunca tomei tanta pinga com coca.
Na final, todo mundo já sabe o que aconteceu. Outro sufoco desgraçado. 100 mil torcedores torcendo contra. Bandeirinha engavetado pelo presidente do Bangu, Castor de Andrade. Jogo único na casa deles. Tomaram no cu do mesmo jeito. Contra tudo e contra todos, o Coritiba venceu nos pênaltis e fez o Brasil inteiro se render à competência desse monstro chamado Ênio Andrade. Ele e o Evangelino da Costa Neves são os grandes responsáveis por termos essa estrela dourada e amada no peito. Que Deus os guarde em bom lugar.
Parabéns, Coritiba Foot Ball Club. Campeão Brasileiro de 1985.
Quem quiser curtir todas essas emoções, só conferir esses vídeos extraídos do dvd Coritiba Campeão Brasileiro, que eu editei pra dar de presente aos jogadores de 85, em 2010.
Parabéns à toda a torcida alviverde...
Gilson de Paula é Coxa-Branca de coração.
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Para que a minha glória a ti cante louvores, e não se cale. Senhor, meu Deus, eu te louvarei para sempre. (Salmos 30:12)