Arquibancada
Umas duas vezes com Lombardi Jr, com quem mais tarde trabalhei na CNT, e outras tantas dezenas com meu ex-sogro, dr. Lyrio do Prado, assisti inúmeras partidas em campos de várzea em Presidente Prudente. Também no Prundentão, algumas partidas do Corinthians de Prudente, o chamado Corinthinha, time que hoje deve figurar na terceira divisão paulista.
Todo domingo tinha um bom jogo pra ver. Pela manhã a gente saia catando jogo pra assistir, escolhia o que prometia ser o melhor. Chegava cedo pra pegar um bom lugar no barranco, comprava um pacotinho de amendoim, chamava uma cerveja pra acompanhar aquele desfile de pretendentes a um lugar ao sol dentro do futebol brasileiro. Ia pra casa, almoçava e à tarde se mandava pro Prudentão, ver o Corinthinha na segundona.
Alguns daqueles atletas até alcançaram alguma coisa melhor, mas a maioria ficou pelo meio do caminho. O que acaba apenas confirmando que a maioria se perde por falta de talento, outros por falta de oportunidade e outro tanto por falta de sorte.
Lembro que naqueles barrancos, ou nas arquibancadas do Prudentão, tinha mais olheiros do que torcida. Alguns vindos de clubes grandes da capital paulista. Acompanhado de dr. Lyrio, homem bem relacionado por aquelas bandas do extremo oeste paulista, fui apresentado a alguns figurões que mal olham pra gente. Não tiravam o olho do gramado. Levavam a sério a missão de levar alguma informação sobre algum atleta pra algum clube grande da capital.
Dezenas deles se espalhavam por aqueles barrancos com olhos só para um determinado atleta. Alguns eram moradores da região, mas que trabalhavam como informantes. Era regra não dizer quem era o escolhido. Não abriam o bico. Alguns deles muito sérios, sem muita conversa, anotavam seus segredos em cadernetas, outros apenas olhavam. Procuravam passar desapercebidos. E muitos deles apenas olhavam , assim como nós, só porque também gostavam de futebol.
Certa vez, demos carona até o hotel a um dos figurões vindos da Capital. No caminho disse que estava em Prudente procurando um volante. Logo descobrimos que se tratava de Guaraci, um “5” da Penapolense, de uma cidade pequena próxima de Presidente Prudente. Guaraci tinha um chute poderosíssimo. Naquele dia bateu duas faltas. Uma da intermediária e outra mais próxima do gol. O chute da intermediária, tirou o reboco da parede de uma construção que ficava a uns 5 metros atrás do gol.
Ainda no carro, quando o olheiro da capital falou o nome do jogador, eu prontamente comentei sobre as duas faltas. Ele disse:
- Pois é, o chute do rapaz é mesmo muito forte, mas sem direção. Precisamos de um batedor de falta com mais categoria. A força serve, mas não é suficiente. É preciso ter um repertório maior. Além de bater bem, de chutar forte, precisa saber quando bater colocado e tirar a força da cobrança. Se tiver mais umas 3 ou quatro qualidades, ajuda mais ainda, arrematou o olheiro naquela nossa conversa curta, mas que me serve até hoje.
Isso foi lá no inicio dos anos 80,quando o futebol exigia mais qualidade mesmo. Nenhum Filigrana teria saído da Colômbia só pelos seus belos olhos, por exemplo. Uma época que João Paulo não teria saído de um time rival, só porque é um volante brigador, voluntarioso.
Foi numa época onde o Coritiba fechou estes mesmos anos 80, com um meio de campo onde sobrava qualidade. Onde um volante como Osvaldo, pra falar do mais fraco deles, teria lugar como 10 no time de hoje. Mesmo com Marildo um meia que pode ser considerado mediano, em 85, além de ter muito mais talento que todos os meias que andam passando pelo Coritiba. Marildo ainda tinha cobrança de falta como qualidade. Um Ìndio que nem era craque, mas artilheiro e também cobrador de falta. Ou seja, todo mundo tinha duas ou três qualidades. Tinha que ter. Do contrário não servia.
O futebol tá mesmo nivelado muito por baixo. Parece que estamos nos acostumando e já não reclamamos com o antes. Nos damos por satisfeitos quando alguém nos dá um drible de presente, em 90 minutos de futebol jogado. Como há muito tempo não nos dão. Ainda é possível ver algum talento, mas nos outros.
Parece que ainda vamos sofrer mais um pouco com tudo isso, azedando de vez esta nossa relação com o futebol. Acho que precisamos achar o nosso lugar de torcedor com a qualidade que estão nos dando. Do contrário, vamos gritar até que nos devolvam o velho e bom futebol, dos saudosos tempos de talentosos jogadores.
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