Arquibancada
Os últimos fatos envolvendo nossa casa, o Couto Pereira, mexeram num baú que há muito eu não abria. Fiquei aqui pensando que a beleza do Couto não está apenas na arquitetura clássica, na imponência e na modernidade - que não tem. A vida dele está em sua história. Coisa quem ninguém tira dele. Nenhuma Arena moderna, legal ou ilegal, licita ou ilícita, como as da Copa.
Para cada canto que olho, tenho uma história para contar do Couto. Quando a capacidade de público do estádio era maior, a gente se pendurava nas torres de iluminação. Era o que sobrava para quem chegava tarde em dia de jogo importante. Ninguém pedia pra gente descer dali, porque era mesmo perigoso.
Dos alambrados, ninguém era o politicamente correto, e atleticano era xingado de viado. Alguns nem sabiam direito o que era aquilo. Estar no Couto e não reverenciar a arbitragem e sua mãe era não ter ido ao jogo, mesmo que o juíz tivesse sido reto no seu ofício.
Foram anos para a cobertura das sociais ficar pronta.
Entre os andaimes, pedaços de madeira, pregos e caliças, a gente ia se ajeitando. Nada daquilo, nunca nada foi arremessado no gramado contra os adversários.
No gramado tínhamos um time que merecia todo este nosso esforço. Tinha espetáculo sempre. Mesmo em domingo de pouca inspiração ou de derrota, a gente saia sempre com a sensação de ter pago um valor justo para assistir àquele espetáculo.
Tinha a Albinha Mazza, a maior Coxa-Branca que conheci. Albinha, pra quem não sabe, era uma espécie de conselheira dos jogadores, um talismã. Merece um capítulo na historia do Clube.
Naquela época ninguém sonhava com CT. Os treinos eram feitos no próprio estádio. A entrada era pela Mauá. Albinha plantava sua cadeira de rodas na calçada, ao lado do único portão de acesso ao vestiário e ali recebia todos os jogadores, um por um, todos os dias. Fosse quem fosse, ela sempre tinha uma palavrinha para cada um, mesmo nos piores momentos. Albinha era de um otimismo até irritante. Ao se referir a um momento ou uma partida ruim, ela dizia: “tá ruim, mas vai melhorar”!
Albinha também sempre foi o primeiro contato de quem cobria o Coritiba. Era ela que dizia, fulano de tal ainda não chegou ou ciclano está mal humorado hoje. Lembro de ter visto algumas vezes Albinha dando “dura” em atleta que fazia corpo mole, ou trazia problemas pessoais para o gramado. OS famosos “chinelinhos”.
Foi no Couto que assisti minha primeira partida de futebol aos três anos, ainda nas arquibancadas de madeira, no colo do meu pai.
Na sequência foi uma sucessão de jogos e tive a felicidade de ver Zé Roberto, Krueger, Lela, Hidalgo, Hermes, Jairo, até meu amigo Sicupira, num inesquecível Coritiba e Corinthians pelo Roberto Gomes Pedrosa, com gol dele. 0x1.
Também passou por ali a badalada seleção de 70, se preparando para o tri do México. O Santos de Pelé, Botafogo de Gerson, Jairzinho, Corinthians de Rivelino...
Com tudo isso, não há estádio padrão Fifa, não tem arquibancada mais importante que as do Couto. Os mais novos vão lembrar de outra geração, como Zico, Socrates, Dirceu Lopes, Reinaldo, que também pisaram ali. Como os nossos craques Tostão, Chicão, Alex, Serginho, Carlos Alberto, Vica, Mazaropi etc.
“O gigante de cimento armado”, como dizia Lombardi Jr, até pode ser substituído por outro mais moderno, mais confortável, mas que seja em outro lugar. Não mexam no Couto. Sei que isso é saudosismo que precisa se render à modernidade, mas o Couto precisa ser patrimônio tombado. Se não por decisão dos homens, pelo menos na minha cabeça fica assim.
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