Bola de Couro
É permanente a discussão entre os da minha geração (e os não tão maduros assim) e os modernos acompanhantes do futebol sobre qual seria o melhor, o “daquele tempo”, onde o que se sobressaia era a atuação do craque, aliada a algum coletivismo, ou o de agora, onde prepondera o preparo físico e o coletivo, alguns times com um ou outro craque e outros até sem nenhum, mas mesmo assim muitas vezes vitoriosos.
Desde já um parêntese. Por “craque” se entenda aquele jogador excepcional, que muito se destaca da média e é capaz de decidir uma partida em lance genial.
Assim, “naquele tempo” tivemos Zico, Rivelino, Garrincha, Maradona e o inigualável Pelé, referências nacionais e mundiais. E na nossa aldeia tivemos Miltinho, Kruger, Zé Roberto e outros. E todos eles tinham companheiros igualmente geniais, cuja relação seria cansativa lembrar aqui (Didi, Ademir da Guia, Leocádio, Alex, a lista não terminaria).
Hoje, poucos times têm um jogador diferenciado que possa merecer o título de craque na exata acepção do termo. Neymar no Santos e Messi no Barcelona, sem dúvida, e quem mais? Sei, os amigos indicarão outros, mas penso que se refletirem bem e compararem verão que serão poucos os que eles encontrarão no mesmo nível daqueles ou no mínimo haverá controvérsia. Alguns espanhóis, talvez, mas a seleção ibérica se destaca muito mais pelo coletivo.
Por outro lado, “naquele tempo” pouca atenção se dava para a preparação física e para a marcação. Esta, para o craque, era uma ofensa. Só marcavam o adversário os jogadores do centromédio (era assim que se chamavam os volantes) para trás. Houve uma evolução a partir da Copa de 1970 quando, na seleção brasileira, além dos centromédios e zagueiros Pelé, Tostão e Rivelino se dignaram a marcar. Eram craques indiscutíveis, mundialmente reconhecidos, mas souberam que já estava na hora de terminar aquela fase em que o craque ficava aguardando que os demais lhe passassem a bola para então tentar a jogada de gênio.
Hoje a preparação física é outra - acredito que se uma máquina do tempo pudesse colocar alguns daqueles craques do passado em confronto com alguns dos jogadores do presente, estes poderiam levar a pior no começo do jogo, mas logo se imporiam pela melhor disposição física. E hoje é dado mais valor à marcação e ao coletivo, e muito à velocidade, com toques rápidos de bola, de modo que mesmo times sem craques, mas com jogadores bons (bom não é craque, é bom) e bem preparados física e coletivamente podem chegar longe como chegou o Coritiba em 1985 e, como esperamos, dará certo na final que se aproxima.
Ontem, no jogo contra o limitado Sport, vi um Coritiba moderno e um “daquele tempo” em dois períodos distintos da partida. Não vou dissecar o jogo e tampouco fazer uma análise pessimista, ainda mais quando estamos em semana que todo o pensamento positivo é bem vindo. Mas vou tentar mostrar o que me saltou aos olhos durante e ao final do jogo.
O Coritiba moderno se mostrou na boa marcação efetuada até certa altura do jogo e na velocidade da troca de passes entre Lincoln e Tcheco, em especial no gol deste que, nem parecendo estar se aproximando dos quarenta nos de idade, chegou à área adversária como um foguete. Foi futebol moderno também o primeiro gol do Coritiba quando Tcheco anteviu a possibilidade do deslocamento do Anderson Aquino e rapidamente lançou a bola entre os zagueiros e este último se deslocou velozmente. Aliás, neste gol, o Marcel, ainda que com todas as suas limitações, teve a inteligência de se deslocar e atrair um dos marcadores de modo a facilitar as coisas para o Anderson Aquino. Destes, que jogaram futebol moderno, mais não se poderia exigir. Lincoln e Tcheco porque sem dúvida a idade pesou e aos poucos foram diminuindo o pique. E o Anderson Aquino pelo prejuízo da lesão que sofreu e o obrigou a sair.
E o Coritiba “daquele tempo” apareceu notadamente a partir da entrada do Geraldo e do Rafael Silva (deixo de lado referências a alguns outros pelo mesmo motivo exposto ao final do antepenúltimo parágrafo). Aquele, imaginando que é craque e vai decidir o jogo sozinho, ao receber a bola abaixa a cabeça e tenta passar por tantos adversários quantos lhe apareçam pela frente. Passa por um, talvez por dois, mas em seguida perde a grande maioria das bolas. E o Rafael Silva parece imaginar que, como promessa e revelação, não pode se submeter à tarefa comum de marcar. Se perder a bola, fica onde está esperando que algum companheiro a recupere, não raro sendo visto com as mãos na cintura. Quem ele pensa que é? Coloquem-no fechado em uma sala para assistir vídeos da dedicação do Tcheco, com vinte anos a mais do que ele, até que aprenda que futebol é um jogo coletivo. Se continuar assim, vai ser uma eterna promessa como tantos foram.
Foi um comentário em forma de desabafo, mas que em nada deve atingir a nossa perspectiva positiva para o jogo de quinta-feira, pois, repito, é somente limitado ao jogo de ontem.
Quanto à decisão, time por time penso que estamos um pouco acima do Palmeiras e poderemos voltar de Barueri com um resultado positivo, ainda que seja um empate com gols. Tudo vai depender, além de uma boa jornada técnica, da dedicação e conscientização da equipe. Futebol coletivo, marcação e velocidade e, de vez em quando, um lampejo de craque dentre os nossos bons. A fórmula do futebol moderno para vencer.
Sou sócio, ajudo a construir o meu Coritiba.
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