Bola de Couro
Tudo indica que teremos realmente uma nova casa, um novo estádio. Não que eu tenha qualquer informação privilegiada, mas as notícias que circulam levam a crer que, tal como afirmava o Barão de Itararé, “há algo no ar além dos aviões de carreira”.
Aos poucos e com responsabilidade as notícias vêm, a venda do Pinheirão foi autorizada e será concretizada, nosso Conselho Deliberativo se reunirá extraordinariamente para apreciar o assunto e, o que é mais importante, há grande viabilidade no negócio proposto e temos uma diretoria honesta e de visão, comprometida com o futuro da instituição Coritiba F.C.
Com efeito, o negócio parece interessar a todos, ao até agora desconhecido investidor e ao Coritiba. Àquele, pois em troca da construção do novo estádio receberá área valorizadíssima em local nobre da cidade, onde, já que não foi possível reformar o estádio, poderá levantar outros empreendimentos altamente lucrativos conforme lhe convier e permitir a legislação. E a nós, porque receberemos um estádio moderno, pronto e acabado sem necessidade de manter sociedade na propriedade e comprometer as futuras rendas do novo Couto Pereira.
Confesso que há alguns meses, quando das primeiras e vagas notícias, minha inclinação era pela reforma do atual Couto Pereira, mas admito que fui movido por sentimentalismo, como provavelmente foram ou são todos que pensaram ou pensam como eu.
Quem viveu ou vive desde a infância, o octogenário estádio do Alto da Glória, certamente sofrerá muita saudade com a mudança. Lembro-me do meu falecido pai contando com emoção ter assistido ao jogo Coritiba x América-RJ (na época um grande clube), em 1932, na inauguração no então Belfort Duarte. Meu filho, Alexandre, que pequenino ia ao estádio nos meus ombros, tem na churrasqueira de sua casa um “pôster” com a foto do momento em que um avião lançou a bola utilizada naquela partida. Eu, criança, em torno de dez ou onze anos de idade, estava no estádio quando simbolicamente iniciaram a demolição das sociais de madeira para começaram as obras na gestão Aryon Cornelsen e que tomaram forma do atual estádio sob a direção do Evangelino Neves.
No Couto ou Belfort, não importa o nome, tive inúmeras alegrias, algumas decepções, talvez, mas destas esqueci. Vibrei, sofri um pouco, xinguei, desopilei, pulei, suei, gritei, abracei desconhecidos, beijei minha mulher e meus filhos e comemorei muito. Conheço cada canto do estádio “de cor”, até seu cheiro está na minha memória.
Vou sentir muita falta do atual Couto Pereira, sem dúvida.
Mas embora o sentimentalismo seja de significativa importância no futebol, há que ser realista e reconhecer que nosso Couto Pereira envelheceu. Já nos deu o que poderia dar, e se quisermos crescer ao ponto de nos tornarmos efetivos protagonistas do futebol brasileiro tal como tantas vezes disse nosso líder Vilson Andrade, um dos passos fundamentais será a propriedade de um estádio moderno, ímpar. A história do futebol é repleta de exemplos de crescimento de clubes na esteira da construção de bons estádios – São Paulo, Internacional e até “eles”, embora logo adiante tenham parado.
A saudade sempre existirá, mas, tal como ocorre quando um filho deixa nossa casa para ter o seu lar, logo a seguir nos alegramos com o crescimento dele ou de nossa família. O Coritiba sempre será grande, e em uma casa melhor certamente será maior.
Mas amigos, assim como quando para aplacar a saudade mantemos uma lembrança material de um ser amado que se mudou, penso que nossa diretoria poderia condicionar o projeto arquitetônico do futuro estádio a um requisito nostálgico.
Explico e desde já registro que o crédito da ideia é do meu filho Alexandre, grande e tão coxa-branca em terras gaúchas como eu.
Como os arquitetos são profissionais que projetam construções destinadas não só à segurança, eficácia, beleza, sustentabilidade, etc, mas principalmente ao ser humano que vai utilizar a obra, sugerimos que o projeto do novo Couto guarde alguma característica do velho estádio, ainda que em um cantinho, uma curva, ou seja lá o que for, mas enfim, algo que nos lembre o Alto da Glória que a fértil imaginação desses criativos profissionais possa levar para o novo estádio. Uma característica arquitetônica, por pequena que seja, que quando dos jogos nos faça lembrar do velho estádio com boa saudade. De modo que, se o novo estádio encontrar torcedores de uma geração que não conheceu o velho Couto, os mais velhos possam apontar aquele desenho, aquela parte, e dizer que o estádio antigo era “daquele jeito”.
Independente disso, e independente da possibilidade arquitetônica, apelo desde já à direção no sentido de que, antes de entregar o velho Couto Pereira ao parceiro, retire uma razoável porção da terra e do gramado que nele se contém e os eternize no novo estádio. E também desde já peço que me registrem como número um – se ninguém pediu antes – na fila para trazer para casa um pedacinho do velho Couto Pereira quando for demolido.
Amigos, vocês não têm nada com isso, mas ao revisar este texto meu deu um nó na garganta.
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