Bola de Couro
Ontem assisti – e obviamente ouvi – o vídeo no qual o ilustre Dr. Mário Schimer, Procurador de Justiça do Ministério Público do Paraná, defendeu o uso das verbas públicas que foram e estão sendo aportadas para a reconstrução do estádio do seu clube, o CAP. Tratou-se de uma reunião interna do clube, que veio a público por ter sido lançada no sítio da entidade na qual o membro do Ministério Público antes referido fez a defesa do CAP na questão do uso de verbas públicas para a reconstrução do estádio do seu clube de coração. E o fez afirmando, em síntese, que verbas públicas podem e já foram usadas em benefício de particulares em outros episódios, que a contrapartida do CAP será a entrega do estádio, circunstância que caracterizaria o interesse público e que, como em outras cidades-sedes da Copa do Mundo os estádios estão sendo construídos totalmente com recursos públicos, ao contrário do que se afirma o CAP estaria economizando dinheiro público (para não me alongar e menos ainda me equivocar na citação, não reproduzo os demais argumentos, indicando aos leitores o acesso ao sítio antes referido). Não falou, sem dúvida, em nome da instituição que honrosamente integra, embora ao início da manifestação tenha se qualificado como ex-integrante do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Proteção ao Patrimônio Público, atributo que o qualifica.
Trata-se de opinião que deve ser respeitada dentro do bom embate, da divergência e do contraditório público que se estabeleceu a respeito dos fatos. Diria a ele como consta que Voltaire teria dito a Rousseau quando soube que escritos do último estavam sendo destruídos: “Não concordo com uma palavra do que dizeis, mas defenderei até a morte o direito de dizê-las.”.
Pois bem, embora a manifestação tenha sido fundamentada, nem por isso se deve concluir que os argumentos apresentados são sólidos e que a conclusão do ilustre Procurador de Justiça é correta. O bom uso da retórica como método de persuasão não significa, necessariamente, que dele resulte convicção e certeza para bem julgar os fatos. A propósito do tema, para não me estender remeto os leitores às colunas que escrevi nos dias 13, 17, 19 e 21 de setembro onde penso se encontram argumentos suficientes para contestar a opinião do ilustre Procurador de Justiça, reiterando respeito à sua opinião como torcedor do CAP e operador do Direito, assim como o faço quase que na mesma condição – operador do direito aposentado e torcedor do Coritiba. Apenas nossas visões sobre a boa gerência da coisa pública, no caso concreto, são radicalmente opostas.
Hoje, a edição online da Gazeta do Povo, a propósito de tal manifestação noticiou que:
“Ex-membro do Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Proteção ao Patrimônio Público, o promotor Mário Sérgio de Albuquerque Schirmer falou sobre o convênio entre Atlético e poder público na reunião do Conselho Deliberativo do clube, em 24/10. Mesmo reconhecendo não ter lido os termos do contrato, ele defendeu a legalidade da parceria. Ontem, o vídeo desse depoimento foi amplamente divulgado em um tuitaço promovido por torcedores. A hashtag #uniãoatleticana, que trazia o link para o vídeo, chegou a ser o assunto mais comentado na rede social do país. Segundo o Ministério Público local, porém, “Schirmer se pronuncia como conselheiro do Atlético e não como membro do MP-PR” e a sua posição “não representa a do MP-PR”.”.
Ao mesmo tempo, da mesma edição se colhe que após o Tribunal de Contas entender os créditos de potencial construtivo como dinheiro público, o Ministério Público do Estado do Paraná deu início a procedimento administrativo para examinar se há alguma ilegalidade na execução da reforma – eu denomino de reconstrução - da arena da baixada e que “Não há prazo definido para a conclusão dos trabalhos e, por isso, a Promotoria deve demorar mais algum tempo para se pronunciar diretamente.”.
Boa providência, sem dúvida. Mas só agora? Somente depois que o Tribunal de Contas conceituou o crédito como dinheiro público? Mas não se denunciava tal conceituação há muito tempo? O Ministério Público, ao contrário do Poder Judiciário, não precisa ser formalmente provocado para agir. Basta ter conhecimento de indícios razoáveis de ilegalidades com a coisa pública para agir de ofício (artigo 22, da Lei nº 8.429/92), mesmo que tais indícios venham através dos meios de comunicação como tantas vezes já aconteceu. Uma pena que só agora comece a agir e já anuncie que demorará em chegar a uma conclusão.
Bem, mas antes tarde do que nunca.
Confio na isenção e espero presteza dos zelosos fiscais da lei do meu Estado natal – lembro que em pesquisas o Ministério Público aparece entre as instituições mais confiáveis perante a sociedade brasileira - para chegar a uma conclusão ainda antes de encontrar os fatos consumados e muito pouco poder fazer para impedi-los. Confio que aproveitarão a oportunidade para apurar o evidente desvio de finalidade nas desapropriações de imóveis no entorno da baixada. Confio que examinarão se as garantias que o CAP ofereceu para receber empréstimo do BNDES, servindo a Agência de Fomento do Estado do Paraná como mera interposta pessoa, são suficientes. Confio que em último caso, se mantidas a entrega do patrimônio e das verbas, pelo menos se investigue se o uso não está sendo direcionado através de nepotismo como fartamente noticiado.
Enfim, ainda que os cidadãos possam exercer diretamente a defesa da coisa pública através de outras medidas – a ação popular constitucional, por exemplo - reitero respeito e confiança na instituição do Ministério Público do Paraná quanto à apuração das ilegalidades e das providencias que adotará, embora as ressalvas antes lançadas sobre a oportunidade do agir.
"É a doença de não escutar, o mal de não observar que me aflige." (Willian Shakespeare)
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