Bola de Couro
O desandar momentâneo do Coritiba desde a final da Copa do Brasil ainda causa perplexidade na torcida e na crônica, cada um tendo sua visão e proposta de correção de rumos. Para grande parte da torcida, o problema se resume ao técnico, válvula de escape e de desabafo em todas as crises das equipes de futebol (mude-se o técnico e, como um toque de Midas, o metal enferrujado virará ouro). Para alguns, da torcida ou da crônica, a baixa produtividade no campeonato brasileiro decorreria de um desgaste natural, a “fadiga dos metais”, uma vez que a equipe, ainda que com limitações, chegou longe de mais nos primeiros cinco meses do ano e é natural que agora tenha queda, esperando-se que ali adiante se recupere. E para outros, aqui muito mais dentre a torcida, a culpa é deste ou daquele jogador, ou destes ou daqueles, que não estão rendendo bem ou, na visão do “eu sempre disse”, nunca foram bons, ainda que, embora não se possa generalizar, em verdade alguns poucos (pouquíssimos, diria) poderiam ser assim qualificados.
Mantendo o crédito e o reconhecimento do clube como um todo pelo que de positivo já foi feito, mas sem que isso resulte em imunidade ou impeça quem quer que seja de opinar, desde que, friso bem, sempre visando ao bem do Coritiba, penso que chegou minha hora de fazer um juízo crítico. É claro que, diante da decepção que estamos sofrendo no momento, frequentando a zona de rebaixamento – de novo, meu Deus! – é difícil a avaliação para quem mescla a condição de comentarista com a de torcedor, sendo necessário, nesta hora, não deixar a emoção superar a razão.
Muito bem, tentando então ser mais comentarista do que torcedor – ou tanto quanto - inicio dizendo que a situação do momento realmente é difícil, mas pode ser recuperada com o que temos à mão. Àqueles que gostam do “eu sempre disse” ou “eu já sabia” e que esquecem que há poucos dias proclamavam ter o melhor time do Brasil (ou até mundo) e que alguns craques mereciam estar na seleção brasileira, aconselho que, mesmo mostrando inconformidade com a situação, se contenham e aguardem um pouco mais. A fase é difícil, mas não irreversível. Não há como um time desaprender de jogar bom futebol de uma hora para a outra, salvo se algo esteja acontecendo do túnel para dentro e nos seja desconhecido, no que não acredito em face da boa liderança que comanda o clube.
Assim, enquanto ainda dou um tempo para recuperação (não muito, espero) convido Marcelo Oliveira a algumas reflexões, a fazer uma autocrítica, ou seja, um exame dos seus atos, visando à correção e retomada do sucesso. Não que debite a ele sozinho o mau momento do time, longe disso, mas porque é ele o comandante direto dos atletas, o formador da equipe e o leitor de cada jogo e do momento de cada jogador. Enfim, é o responsável maior que é produzido em campo.
Para tanto, sugiro que primeiro deverá se imunizar contra a tentação a que muitos técnicos se submetem, qual seja a de, quando a equipe vai bem, fazer modificações inesperadas para tentar provar que o sucesso do time se deve muito mais a ele do que aos demais componentes do todo. Quem não lembra a notória necessidade de auto-afirmação do Carpeggiani quando foi nosso treinador nos difíceis anos 90 e, em partida decisiva, “inventou” o zagueiro Jorjão (se não era esse me corrijam, estou escrevendo sem conferir) como centroavante? Se desse certo, todos diriam que ele era um gênio! É claro que deu errado, pois tinha tudo para dar errado. E mais recentemente, o vetusto Antônio Lopes (que, embora a idade, nunca deixasse de se auto-louvar como um novato) com Pepo em partida decisiva em que sua atuação foi fator preponderante para nossa derrota?
Espero que não o tenha feito com a mesma visão egoísta e pequena do Carpeggiani e do Lopes nos episódios citados, mas a inesperada, surpreendente e equivocada entrada do Marcos Paulo (que nem no banco de reservas costumava ficar) na final da Copa do Brasil traz o mesmo selo e é unânime o sentimento de que foi fundamental para a perda do título. Quero crer que o móvel da ação do Marcelo Oliveira não foi o mesmo daqueles treinadores, pois ao que se denota de suas manifestações não sofre do mesmo mal, é um homem ponderado e sem soberba. Mas, caro Marcelo Oliveira, fazer experiência logo na partida decisiva, alterando profundamente a forma de jogar que vinha se provando bem sucedida? Pensou bem, teve o apoio da comissão técnica e dos jogadores mais experientes e líderes, ou supôs estar descobrindo a pólvora? A esta altura a reflexão já deve ter sido feita e sinal de grandeza de caráter será admitir ou já ter admitido o erro que nos custou tão caro e se policiar para nunca mais cometer outro igual ou parecido.
Outro aspecto que espero leve Marcelo Oliveira à reflexão e autocrítica se estas linhas chegarem a ele é o referente à desconsideração do fato de que todo o jogador de futebol tem momentos bons e ruins, e quando estes acontecem não é desrespeito e nem punição nenhuma afastá-lo temporariamente do time, tanto para que se aprimore em treinamentos, como para que renove o espírito (às vezes mais para isso). É o caso, no momento, do Léo Gago e do Davi, ambos até a pouco com excelentes atuações e que evidentemente não podem ter desaprendido de jogar. Talvez um descanso, cujos resultados psicológicos poderiam ser positivos, seja a solução pra que voltem a ser os craques que tanto nos empolgaram (Um parêntese: Davi deve levar uma sacudida, no sentido de que não é possível que cada encontrão, empurrão ou chute do adversário o faça sofrer tanto, ficar por tanto tempo caído em campo e necessitando atendimento, mostrando-se em seguida claramente intimidado. Quem sabe ele olha algumas atuações do Leandro Donizete para ver como este se comporta quando das pancadas que recebe?).
Por fim, na pretensiosa sugestão que eu faço ao Marcelo Oliveira, peço que avalie a insistência que tem mantido com uma escalação e algumas não-escalações.
Everton Costa, já disse, e o fiz pelo que vi em duas temporadas na dupla Grenal, foi um erro de contratação. É, como me disse um amigo integrante da direção do Grêmio, jogador que dificilmente erra passe. Como assim? Sim, não erra, pois não se compromete, recebe a bola e a devolve para o colega mais próximo, ou como disse o mesmo amigo, é um “carimbador”, nada mais do que isso. Espero, e não passo da mera conjectura, que a insistência com tal jogador não se deva à necessidade de tentar provar para a direção que a indicação pela sua contratação foi acertada. Se for, o punido é muito mais o time do quem indicou a contratação. E reitero que sempre estarei disposto a me resignar a “engolir” as palavras caso o atleta um dia corresponda à condição de integrante de time grande e não só nos pequenos como até agora aconteceu, mas acho difícil.
Enquanto isso, Leonardo pouco tem sido aproveitado, e ontem contra o Cruzeiro mostrou o quanto diferente o time ficou depois que passou a atuar. Sem dúvida é um jogador inteligente e produtivo, cuja companhia acabaria com a solidão do Bill, assim como acontecia com a presença do Anderson Aquino, fórmula que até a pouco dava certo. Muito difícil entender Everton Costa entrando em campo muito antes do Leonardo. A diferença de qualidade entre os dois é abissal. E o Tcheco, ainda que se saiba que não tem condições físicas para enfrentar uma partida inteira, é essencial quando se mostra necessário cadenciar o jogo ou administrar vitória, mas inexplicavelmente dificilmente é escalado.
Podem ser situações pontuais e as visões da crônica e dos torcedores podem ser diferentes em um ou outro aspecto, mas um equívoco aqui e outro ali certamente estão sendo vistos e trazem reflexos à equipe. Quem já mostrou bom futebol nunca o desaprende, apenas talvez esteja em momento ruim e deva parar um pouco e ser substituído por quem já mostrou que sabe e não esteja sendo aproveitado ou esteja sendo subaproveitado. E quem nunca mostrou nada, deles nada se espere e não será a insistência que os melhorará.
Marcelo Oliveira e a equipe como um todo têm crédito e merecem respeito, já disse e repito. Não me incluo dentre aqueles que esquecem tudo o que já foi feito e conquistado e pregam mudanças radicais, tais como demissão de treinador, empréstimo ou devolução de atletas que há alguns dias eram tidos como excelentes, contratações “de peso”, enfim, supõem que uma mera troca de nomes será a salvação. Todos os que dirigem o Coritiba, administrativa e tecnicamente, e os atletas, estes salvo poucas exceções, já mostraram o que podem – e é por isso mesmo que externo confiança, pois se puderam é porque poderão – mas está mais do que na hora da reflexão e da autocrítica e, em consequência, da correção dos rumos e da não repetição dos erros para retomada do bom caminho.
Fases boas e ruins são próprias a qualquer equipe de futebol. Ambas não são intermináveis, mas enquanto a primeira exige muito mais manutenção do que outro qualificativo para se prolongar, a segunda obriga a mudanças e correções para cessar, pois o passado, do qual podemos e devemos nos vangloriar, nunca deve servir como excludente para o fracasso do presente ou do futuro.
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