Bola de Couro
O Poder Executivo editou a Medida Provisória 984/2020, segundo a qual os direitos de transmissão ou reprodução das partidas esportivas pertencem ao clube mandante do jogo. A MP altera a Lei Pelé, que antes da mudança distribuía o chamado “direito de arena” entre o dono da casa e o adversário da partida.
Na prática, a mudança significa que a emissora de TV ou rádio interessada em exibir a partida precisará negociar apenas com um time, ao qual pertencerá o direito denominado como “de arena”, e não mais aos dois. Segundo a MP, a negociação com os dois times só ocorrerá se houver indefinição quanto ao detentor do mando de jogo.
Essa medida está sendo saudada pelos clubes chamados de “grandes”, que reúnem as maiores torcidas do país, mas para os interesses dos clubes ditos periféricos, como é o Coritiba – não podemos negar isso em nome de um irreal orgulho – penso que é danosa.
Flamengo, Corinthians, Palmeiras e outros do centro do país poderão negociar todos os seus jogos por bom preço, seja qual for o adversário, afinal, têm as maiores torcidas do Brasil. Quando jogarem entre si poderão exigir valores altíssimos.
O Coritiba, para ficar no que nos interessa, quando jogar com o Flamengo, Corinthians e outros “maiores” e for o mandante, poderá negociar satisfatoriamente o valor da transmissão. Mas e quando não for o mandante contra esses nada receberá e quando jogar contra o Bragantino, o Atlético-GO ou o Fortaleza, quanto poderá exigir? Muito pouco e receberá bem menos do que receberia se o sistema de distribuição anterior se mantivesse.
A medida provavelmente ainda implicará em disputa judicial, pois a Globo e a Turner não irão aceitar que os contratos vigentes sejam atingidos,uma vez que afronta ato jurídico perfeito. Prenuncia-se um campeonato brasileiro tumultuado nos tribunais. Em assim ocorrendo, e o Judiciário reconhecendo que nova lei não se aplica para a atual temporada, pelo menos neste ano o Coritiba se beneficiará, pois há poucos dias negociou com a Globo a transmissão pela TV aberta.
Diploma legal desse tipo vigora por 60 dias, prorrogáveis por mais 60 (se não for em 45 dias ocorre o que se chama de trancamento de pauta), até que o Congresso o aprove ou rejeite. Pois bem, se no curso do campeonato a MP for rejeitada – não acredito muito nisso, em seguida digo a razão – como ficarão os clubes em relação aos jogos já disputados?
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Disse que não acredito que a medida deixe de ser aprovada pelo Congresso, pois embora o Senado conte com número de representantes igual por Estados, na Câmara a composição é proporcional ao eleitorado e como sabemos São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais concentram a maioria dos ditos representantes do povo, sem contar que nos Estados do Nordeste é forte a torcida pelo Flamengo e outros clubes cariocas, o que influirá no ânimo de decidir dos parlamentares.
Há uma gama de circunstâncias que envolvem o ato governamental, a serem melhor analisadas, as quais ao fim e ao cabo só devem favorecer aos ditos “grandes” clubes – que certamente ficarão mais fortes ainda, desigualando mais a disputa. Há sempre o risco de que os fatos desmintam a minha interpretação e a discussão não deve parar por aqui e será enriquecida com a opinião de lidadores do Direito especializados, o que não sou, e por isso não afasto que algum aspecto tenha me fugido, mas é o que concluo em um primeiro exame.
Enfim, não é sem razão que o diploma legal recebeu o nome de "MP do Flamengo". Eu o denominaria de “MP do canto das sereias”.
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