Coração Verde e Branco
Tirei alguns minutos da minha noite para refletir sobre o Dia Internacional da Mulher, sua importância, sua razão para existir e sobre as mudanças que vimos no mundo, e acabei por ser remetido ao lugar mais maravilhoso do mundo e lembrar como as mulheres começaram a frequentá-lo.
Meu pai começou a me levar no Couto Pereira quando eu tinha cerca de 5 anos, confesso que no início isso me parecia mais um passeio para comer pipoca e tomar sorvete no estádio, afinal, os gols não saiam tão rápido quanto no Fantástico, mas uma coisa que me chamava muito a atenção é que minha mãe nunca ia conosco.
Dentro do Gigante de Concreto Armado situado no bairro do Alto da Glória a situação era ainda mais estranha, não haviam outras mães, no máximo umas poucas mulheres que mesmo quando acompanhadas por alguém (namorado, marido) eram ofendidas com xingamentos pesados por uma razão que até hoje não entendo, algumas delas andavam sozinhas pelo estádio e eram agredidas de modo ainda mais cruel. Cheguei a ver obscenidades que hoje se acontecessem hoje a pessoa sairia presa do estádio (se tivesse sorte o suficiente para isso). Essas ações serviram para formar na minha cabeça o dogma de que “estádio de futebol não é lugar para mulheres”, afinal, eu não queria ver minha mãe, e mais tarde minha irmã ou namorada passando por aquela situação.
O tempo passou, minha irmã nasceu (ela era 6 anos mais nova do que eu) e já adolescente começou a pedir para ir ao Couto Pereira conosco; os tempos já eram outros, já havia uma presença feminina mais marcante no estádio, mas a Lili seguia ficando em casa, até que veio uma promoção que eu sinceramente não lembro qual era, mas era algo relacionado a comprar uma quantidade X de produtos e ganhar ingressos para o jogo do seu time de coração, pois bem, minha irmã apareceu com dois ingressos, um pra ela e outro pra minha mãe, que já estava com a “cabeça feita”.
Anúncio feito na tradicional mesa de jantar portuguesa, não pra cá, não pra lá, “eu vou”, “nós vamos sozinhas então”, inúmeras tentativas infrutíferas de demover as duas da ideia e por fim, percebendo que a teimosia não ia ser eliminada, nos demos por vencidos.
Domingo de sol, estádio cheio, família sentada na reta da Mauá, onde hoje e a Pró-Tork.
Eu não vou lembrar o resultado da partida, mas lembro muito bem que saímos perdendo devido a uma falha individual e o idiota sentado na frente começou a xingar o time todo e isso não terminou bem pra ele.
Final de partida, fomos comer e voltamos para casa. O que havia começado como uma guerra na mesa de jantar terminou como um incrível programa de família. Meu preconceito se reverteu em uma grande amiga que ia a diversos jogos comigo e começou a convidar as amigas. Saímos da Reta da Mauá e fomos para a curva da Império onde ela podia cantar e pular a vontade. Minha namorada (hoje esposa) chegou a ir em um jogo conosco, mas não se apaixonou pela energia que emana da torcida.
Quando eu saí de Curitiba, minha irmã se encarregou da tarefa de levar nossos pais para o estádio sempre que possível, e não tenho vergonha de dizer que fez isso muito melhor do que eu.
Quando olhamos para o estádio hoje, vemos as mulheres ocupando o lugar delas nas arquibancadas de concreto, são avós, mães, filhas, netas, mulheres de todas as idades, de bebês a senhoras de idade avançada que compartilham conosco o mesmo amor pelo Coritiba. São mulheres que junto conosco formam a torcida mais maravilhosa e mais bonita do mundo, mulheres que cantam, que gritam, pulam, xingam, choram e comemoram conosco. São mulheres que brigaram muito para mostrar que podem e devem estar no Couto conosco, que superaram um preconceito assustador e que talvez quem não tenha visto, não entenda o tamanho da bronca que elas venceram.
Que essas mulheres tragam cada vez mais gente ao estádio, que tragam seus filhos, seus maridos, netos, irmãos, que nos ajudem a trazer a família Coxa Branca ao Couto Pereira.
Feliz Dia Internacional da Mulher a todas as Coxas Brancas que fazem um Coritiba cada dia mais forte.
Hoje eu espero ansioso o dia apresentar o Couto Pereira para minha filha, nossa hora vai chegar, mas isso só vai ser possível porque lá atrás elas brigaram por esse direito.
Meu muito obrigado a todas as mulheres Coxa Brancas, especialmente a minha mãe e minha irmã por não deixarem de lutar.
Saudações Sempre Alviverdes
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Para que a minha glória a ti cante louvores, e não se cale. Senhor, meu Deus, eu te louvarei para sempre. (Salmos 30:12)