
De Torcedor pra Torcedor
A cada início de temporada – marcada pelo verão que incide no hemisfério sul, sinto falta de um ingrediente nas partidas de futebol: a boa e gelada cerveja para ajudar a diminuir o calor nos estádios por onde o Coxa se apresente.
Recordo-me da época em que se podia ir ao estádio e acompanhar as partidas sorvendo alguns goles da refrescante bebida, da mesma forma como sinto falta das bandeiras, dos foguetórios, da liberdade em participar da festa do futebol sem as formalidades que o chamado ‘futebol moderno’ nos trouxe.
Além da gelada cerveja nos dias quentes de verão, lembro também da boa sensação proporcionada por alguns goles de quentão nas noites frias do inverno curitibano – bebida tão tradicional de nossa terra, que também costumava ser comercializada nos estádios da nossa capital.
A proibição da comercialização destas bebidas foi mais uma das famosas canetadas do presidente da CBF, Ricardo Teixeira – quem não se lembra daquela de 1989?
No dia 25/04/2008, o mandatário do futebol brasileiro assinou uma resolução por intermédio da qual não seria mais permitido o consumo de bebidas alcoólicas nos estádios, sob o pretenso argumento da diminuição da violência nestas praças.
Tal resolução, em verdade, serviu para complementar a norma descrita no artigo 98 do Regulamento Geral das Competições, emanado pela própria CBF, o qual dispõe: Art. 98 – A venda e o consumo de bebidas alcoólicas nos estádios que sediarem as partidas das competições serão regulamentados, para as finalidades do RGC, através de Resolução da Presidência da CBF. Parágrafo único – Todas as determinações legais referentes a venda e consumo de bebida alcoólica aplicam-se às competições.
O artigo 1º deste mesmo regulamento explicita o conceito de ‘competições’: Art. 1º - As competições oficiais coordenadas pela CBF, doravante denominadas apenas como competições, reger-se-ão pelo presente regulamento.
Isto significa dizer que a proibição deveria se restringir às competições organizadas pela entidade máxima do futebol brasileiro, na totalidade do território nacional.
Não é o que vemos na prática. Em se tratando de competições organizadas pela CBF, como a Série B do campeonato brasileiro, por exemplo, esta proibição não alcança todo o território brasileiro.
Exemplos são diversos, um deles é o relato de um casal de amigos que acompanharam a vitória Coxa-Branca por 2x1 diante do América/RN, em Natal/RN - jogo válido pelo primeiro turno da Série B 2010, oportunidade em que se depararam com a venda de cerveja e até mesmo de cachaça no Estádio Machadão – primeira constatação da ausência de mecanismos eficientes que visem o total alcance da estapafúrdia norma criada.
Seguindo na esteira da suposta diminuição da violência, o Ministério Público do Paraná praticamente obrigou os três representantes dos principais clubes do futebol paranaense a assinar um Termo de Responsabilidade, por intermédio do qual não comercializariam bebidas alcoólicas em seus estádios, independente de qual entidade fosse a responsável pela organização da competição, se a CBF ou a FPF.
Na prática, tem-se a triste realidade de que nos estádios do trio de ferro, independente da competição que for, os torcedores jamais poderão acompanhar as partidas de seus times do coração, acompanhados de suas bebidas preferidas – um completo absurdo, uma afronta ao direito de escolha do consumidor.
Resolvi tocar neste assunto, porque neste último domingo, as imagens da televisão mostraram diversos torcedores na cidade de Arapongas/PR com copos de cerveja na mão na partida diante do Coritiba – alguns deles, inclusive, sendo arremessados para o interior do gramado. Há notícias de que estas cervejas não eram aquelas sem álcool.
Diante disto, questiono-me: se o critério para a proibição de comercialização das bebidas alcoólicas dentro dos estádios se baseia na diminuição da violência, isto significa dizer que somente os torcedores de Coritiba, P. Clube e A. Paranaense é que são ‘violentos’? Não há violência nos demais estádios do Paraná ou lá em Natal, por exemplo? A verdade é que esta norma é absolutamente discriminatória e desprovida de conteúdo.
Pelo pouco que aprendi nos bancos da Academia de Direito, sei que uma norma encontra eficácia na medida em que efetivamente atinja seus objetivos e mais do que isso, é válida quando sua aplicação se estende a todos os jurisdicionados, sem exceção.
A constitucionalidade desta proibição que atinge os curitibanos já foi, inclusive, alvo de declarações do advogado Dr. Gilson Goulart Jr em matéria veiculada aqui no Portal COXAnautas.
Para aclarar ainda mais o caráter vazio desta sanção, continuo com minhas perguntas interiores:
2014 será o ano da Copa do Mundo no Brasil.
Sabe-se que uma famosa companhia de cerveja é uma das patrocinadoras do evento.
Tomando como base a premissa de que a comercialização de bebidas alcoólicas nos estádios é uma das causas da violência, dever-se-ia crer que os torcedores que vierem assistir ao mundial devam ficar de ‘garganta seca’, tal qual acontece com os curitibanos, afinal, o que diz mesmo o discurso? Que se tem que evitar a violência...
Para ‘surpresa’ geral, há sérios rumores que para a Copa do Mundo o consumo destas bebidas ‘proibidas’ por Ricardo Teixeira e pelo Ministério Público do Paraná estarão liberadas. Por analogia ou consequência lógica, seria correto afirmar que a violência, durante o período do mundial também?
Para encerrar, demonstrando mais uma vez o quanto as normas são ‘cumpridas à risca e de modo uniforme em nosso país’, cito o contido no artigo 7º daquele mesmo regulamento adotado pela CBF: Art. 7º - Compete ao clube que tiver mando de campo: (...) 4) Tomar as necessárias providências para que os pisos dos gramados estejam em condições normais de uso.
Sendo assim, ou o gramado do Estádio dos Pássaros, em Arapongas/PR, inaugura um novo padrão do conceito de ‘condições normais de uso’ ou o clube mandante será apenado por não tê-lo mantido nos padrões que ainda são adotados.
Não havendo uma punição ao mesmo, diante do verdadeiro matagal lá cultivado, teremos mais uma vez a repetição do desfecho característico para os problemas enfrentados no país do faz de conta, e olha que a julgar pelas 'brilhantes' declarações do presidente da Comissão de Inspeção e Vistoria dos Estádios, Reginaldo Cordeiro, a FPF nada pode fazer. Se ela não pode, quem pode, Sr. Reginaldo?
Registro, em tempo, que esta coluna em nenhum momento estimula ou defende o consumo de bebidas alcoólicas - mas tão somente à aplicação correta e justa da lei, esperando que a mesma alcance a todos ou não alcance ninguém, afinal, esse um dos direitos mais importantes que a Constituição Federal comporta -, nem tampouco serve para fazer apologia à violência (mesmo diante da notória obviedade desta afirmação, nunca é demais registrá-la).
União, trabalho e muitos sócios = Coritiba forte e vencedor!
Saudações Alviverdes,
Percy Goralewski
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