Eterno Campeão
Reiteradamente, ouvimos a palavra amador associada ao insucesso de dirigentes de clubes de futebol, em oposição à palavra profissional, que sugere algo sofisticado e bem-sucedido. Quanto mais observo o mundo da bola, mais tenho ressalvas ao uso da palavra profissional neste contexto. Não pretendo com isso, desmerecer os avanços trazidos pela profissionalização do esporte, que são inegáveis. Mas vejo que o motivo do sucesso financeiro do futebol, movimentando cifras altíssimas, só existe em função de muitas heranças dos tempos do amadorismo e semiprofissionalismo.
Muitos se referem ao esporte bretão, como produto. Nada poderia ser mais equivocado. Se assim fosse, quando o produto não agradasse, mudaríamos de fornecedor. Acompanharíamos os jogos dos melhores times, e não torceríamos para ninguém. Seria satisfação 100% garantida, e os “consumidores” não teriam que lidar com frustrações, como a que ocorreu conosco neste sábado de maio. Seria fácil, apenas recorreríamos ao Procon ou ao Reclame Aqui.
Sinto dizer que se desse modo fosse, não teria sobrado um clube brasileiro. Todos seriam levados à falência. Pagaríamos pacotes dos campeonatos europeus endinheirados, e nosso contato com futebol seria apenas o televisionado. Não teríamos clubes tradicionais e centenários no Brasil, pois na visão dos negócios seria muito mais eficaz termos clubes-empresa, nos quais não haveria paixão envolvida e que cobranças justas e injustas de torcedores não ocorreriam ou seriam desconsideradas, de modo que os gestores poderiam atuar com frieza para ter produtos (jovens jogadores) rentáveis, com o menor investimento possível.
Acontece, porém, que se não fosse a presença dos mesmos resquícios de amadorismo nos clubes dos mercados lucrativos, não se investiria tão alto como se faz, porque os torcedores de lá poderiam adotar a mesma forma de pensar, e mudar constantemente de equipe de acordo com a satisfação proporcionada pelo “produto” oferecido.
Cabe agora, definir melhor ao que me refiro, como resquícios do amadorismo, neste caso, sem tratar-se de uma abordagem pejorativa. Pelo contrário, essencial ao sucesso financeiro do futebol. Trata-se da motivação.
A motivação de dirigentes, jogadores, treinadores e torcedores, no futebol amador e semiprofissional era vencer, se divertir fazendo aquilo que se gostava, e algumas vezes complementar sua renda, no caso de jogadores e treinadores; e de ver vencedor o coletivo com o qual se identificavam ou do qual faziam parte, além de se divertirem, nos casos dos dirigentes e torcedores. Esta motivação, que também pode ser denominada de paixão, amor, e que é falsamente ressaltada por jogadores, treinadores e até dirigentes mal-intencionados para obter a satisfação dos seus próprios interesses.
O futebol de hoje no Brasil é profissional? Será que as divisões desiguais de verbas entre os clubes nas cotas de TV, favorecem um campeonato competitivo e interessante? As arbitragens são capacitadas e idôneas? Os dirigentes respondem como profissionais pelas suas atitudes gerenciais? Os tribunais esportivos são independentes e agem com critérios previsíveis? O que dizer, dos gramados dos estádios usados nas competições? Demonstram alguma similaridade com profissionalismo?
Só ouço essa palavra na boca dos dirigentes e dos profissionais ligados ao futebol, para justificar negociatas com “empresários”, nas transferências de jogadores, nas quais a maior parte do lucro fica com atravessadores, que não investem nada em formação. Ou ainda, proferidas por atletas mercenários para justificarem sua ingratidão pelas instituições que os apoiaram durante anos, mesmo que quando ainda iniciantes cantassem em verso e proza seu amor pela camisa de ocasião.
Estaria aqui, romanticamente, fazendo apologia ao retorno ao amadorismo? Negando a evolução do esporte em inúmeros aspectos? Certamente que não. Mas no cenário desolador no qual se encontra o Coritiba, acredito que já passou da hora dos que falam diuturnamente em profissionalismo, realmente agirem dessa forma, em prol dos interesses desta instituição centenária, que só existe pelo amadorismo dos que construíram seu nome e sua história, e resgatarem o lado amador que acompanha os que lutam de verdade por uma causa.
Sonho com um Coritiba gerido e representado por profissionais competentes e honestos, mas que mantenham em si aqueles resquícios de amadorismo, no sentido de serem apreciadores, amantes, entusiastas, como se estabelece nos dicionários. Desse modo, acredito que continuaríamos tendo frustrações inerentes ao esporte, em virtude do imponderável, da qualidade superior e do poderio econômico de alguns adversários, mas jamais com situações vergonhosas, e preocupantemente frequentes, como as quais tivemos a que nos sujeitar, sobretudo nos últimos anos. Será que isso é possível?
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