Falando de Bola
Eram 10:00 hs da manhã do dia 16/10/2012 quando meu telefone celular tocou. Eu, no trabalho, vejo que o nome Alex estava vibrando na tela.
Do outro lado da linha, o grande craque, eufórico diz:
“Velho, pode ficar tranqüilo. Acabei de assinar com o clube. Mas não divulga ainda não, pois o clube vai anunciar amanhã, no intervalo do jogo contra o Náutico.”
O sorriso logo tomou conta do meu rosto. Aquela notícia era esperada há muito tempo, não só por mim como por toda torcida Alviverde.
Enfim, o “menino de ouro” do Alto da Glória, disputado por tantos clubes brasileiros e do exterior, estava voltando pra casa, provando que no futebol moderno ainda existe espaço para o romantismo, para o amor a camisa, não se importando se os valores recebidos eram o de melhor proposta.
E a melhor proposta estava longe de ser a do Coritiba, porém, além do amor pelo clube do coração e da promessa feita a ele mesmo de que encerraria o seu ciclo no clube que o revelou para o futebol, as condições de trabalho que o Coritiba possui atualmente tiveram grande importância em seu retorno.
Alex é daqueles craques a moda antiga. Enxerga o jogo como poucos. Quando recebe a bola, já tem a jogada a fazer em sua cabeça. Passes precisos, arremates perfeitos, gols de cabeça e liderança natural dentro de campo fazem parte da carreira deste craque do futebol brasileiro.
A apaixonada demonstração de carinho da torcida turca no dia em que anunciou sua despedida do Fenerbahce e mais de 10.000 pessoas que estiveram no Couto Pereira para recepcioná-lo, na tarde de um dia útil, provaram que Alex, no alto de seus 35 anos, ainda tem muito futebol para mostrar.
O Blog “Falando de Bola” traz uma entrevista exclusiva com um dos maiores jogadores brasileiros de todos os tempos.
A imagem que marcou a vitória contra o Arapongas foi o seu abraço no técnico Marquinhos Santos após a marcação do gol da vitória. Qual o significado daquele gesto?
Alex: Um significado singelo e muito simples. O Marquinhos é um treinador novo em inicio de carreira como treinador de equipes profissionais, porém com alguma experiência com as categorias de base.Foi muito bem no Atlético Paranaense, no Coritiba e também na Seleção Brasileira. Muitos acham que eu estou defendendo o Marquinhos como pessoa, o que não é verdade. Defendo um trabalho que ele faz muito bem durante a semana. Quem tem a oportunidade de ver, sabe que ele é um treinador moderno, com treinamentos e idéias boas e diferentes. Questioná-lo em suas substituições, idéias, eu vejo como totalmente normal, mas pedir sua saída eu acredito ser um exagero enorme. As perguntas que faço são simples: Se ele sair por qualquer razão, quem viria para o seu lugar? Um treinador ganhando muito mais dinheiro, e sabemos que o clube não tem uma condição financeira boa para se dar a esse luxo, um treinador com os vícios que todos conhecemos? Um treinador que trabalha pouco e que só tenta motivar? Um que não tenha comprometimento nenhum com o clube? Ou então aqueles que ficam trabalhando pela multa rescisória?Então meu abraço não foi do jogador que fez o gol da vitória, mas sim de um torcedor privilegiado que vê o dia a dia dele e percebe seu comprometimento com tudo dentro do clube, e principalmente sua capacidade como treinador de futebol.
Que fatores você apontaria para explicar as dificuldades que o Coritiba vem tendo neste início de temporada mesmo atuando contra adversários mais fracos tecnicamente?
Alex: A nossa grande dificuldade tem sido entender o desejo do Marquinhos. Ele tem treinado duas ou até três formações para tentar quebrar a marcação adversária quando elas estão encaixadas. Em alguns jogos funcionou muito bem, em outros não aconteceu. Posso citar como exemplo o jogo contra o Londrina, quando na mudança do Chico saindo da zaga e adiantando para o meio, conseguimos equilibrar o jogo e vencemos. No Atletiba até o 2x0, o Atlético não viu a cor da bola, mas em compensação não vimos a bola no jogo contra o J. Malucelli no Couto Pereira. Não nos achamos também no primeiro tempo contra o Paraná no Couto. Essa é parte coletiva, mas individualmente tivemos atuações abaixo do que podemos mostrar, não só na parte técnica, mas também taticamente, em cima do que o Marquinhos treinou, e principalmente mental. Mentalmente muitas vezes fomos dispersos. Devido a isto, o nosso rendimento ainda não agradou ninguém. Vejamos os jogos contra o Paranavaí, Nacional e o ultimo contra o Arapongas. O Marquinhos fez tudo o que podia antes, mas durante o jogo, não nos achamos em momento algum. Por isso digo que o papel do treinador vai até um certo ponto, depois é conosco. É importante que todos saibam quem pode render mais, quem esta crescendo, quem sente o jogo, quem realmente quer ou esta somente passando tempo. Tudo isso é um processo difícil e complicado que passamos nesse momento e além do mais temos que vencer. Isto tudo causa certo desequilíbrio, mas vejo com bons olhos para que a diretoria, comissão técnica e nos próprios jogadores saibamos quem é quem e com quem podemos contar.
O Coritiba fez 20 jogos na temporada, sofrendo apenas uma derrota e conquistando o primeiro turno do campeonato paranaense de forma invicta. Mesmo assim a torcida não está satisfeita com o time, insatisfação que chegou ao ápice no jogo contra o Arapongas. Após anos fora do Brasil, este tipo de cobrança ainda lhe surpreende?
Alex: Não me surpreende porque sou coxa-branca também e sei muito bem como funcionam as coisas em nosso clube. A insatisfação existe por essa irregularidade que temos demonstrado ao longo do campeonato. Apenas acho que devemos ponderar e separar muitas situações. Fizemos coisas ruins, mas também fizemos coisas boas. Porém temos que ter na cabeça que temos que melhorar muito em vários aspectos, e isso passa pelas arquibancadas também.
Falando em arquibancada, a torcida do Coritiba é conhecida por ser extremamente exigente. Existem jogadores que sentem mais a pressão do que outros. O que o atleta e comissão técnica podem fazer para que esta pressão não atrapalhe as suas atuações dentro de campo?
Alex: Mentalmente não somos fortes. Isso eu tenho dito desde quando voltei ao clube. Achamos que somos menores do que somos a nível nacional, e achamos que somos maiores do que realmente somos a nível estadual. Isso é nítido pra mim. Olhando dentro do clube ou passeando pela cidade tenho a mesma noção. Jogar para nossa torcida teria que ser um prazer para todos, mas não é, por que muitos vão preocupados em como serão recebidos pela própria torcida. Vários de nossos jogadores são xingados no aquecimento, e esse atleta xingado começa a pensar: “a minha torcida está contra o time ou contra mim? até onde tenho direito de errar?” Porque somos todos seres humanos e com o sentimento colocado a prova de julgamentos de muitos que às vezes xingam o jogador mesmo sem tê-lo visto jogar ao menos uma partida. Isso provoca reações diversas e ai o rendimento individual dependerá como estará mentalmente cada um nesse momento.
Mesmo com a sua presença em campo, o Coritiba vem tendo uma média baixa de público nesta temporada nos jogos disputados no Couto Pereira. A maioria atribui o valor dos ingressos avulsos como um fator que tem espantado o torcedor dos estádios. Qual sua opinião sobre isso?
Alex: É um problema cultural, não apenas um problema de nós coxas-brancas. Tem várias questões, como o preço, o desconforto, como chegar, onde estacionar, a violência e outros fatores. Em relação a mim, eu não tinha nenhuma ilusão de jogar para grandes públicos, porque infelizmente o Coritiba não tem esse tipo de torcedor que lota o Couto em todas as partidas. Eu sabia que causaria um sentimento diferente no torcedor com meu retorno, mas nunca me iludi com isso. Tiveram 10 mil pessoas na minha apresentação, fiquei realmente surpreendido com aquela tarde, mas sabia que tudo voltaria ao normal com o passar dos dias.
Apesar de grande parte de a imprensa nacional publicar que o seu amor pelo Coritiba e um pedido de sua esposa teriam influenciado diretamente em seu retorno ao clube, você é enfático em dizer que sem as condições de trabalho atuais e o projeto apresentado você não retornaria neste momento. Quais as principais diferenças do Coritiba de 1996 para o Coritiba de hoje?
Alex: Realmente sou coxa-branca, isso é um fato. Mas o restante é folclore. Minha mulher não me pediu nada, minha família não participou de nada. Talvez se eles tivessem influenciado, eu não estaria aqui hoje. Todos na minha casa pensam que eu carrego uma responsabilidade extra ao voltar ao clube, todos acham que eu faria comparação com as situações que tive em outros clubes. Eu voltei primeiro porque queria ter o prazer de jogar mais um pouco com nossa camisa, mas não voltaria se o clube estivesse como era quando eu surgi na década de 90. Hoje está administrativamente bem organizado, tem condições físicas para que o time usufrua, tem um sistema profissional oferecido aos atletas, tem um departamento de futebol muito bom com grandes profissionais. Não conheço a condição financeira do clube, mas o Coxa tem totais condições de oferecer tudo o que for necessário para qualquer profissional de futebol.
Mesmo reconhecido por ser um atleta extremamente profissional, qual é o sentimento de entrar em campo com a camisa do Coritiba, sendo um torcedor ferrenho do clube? Como isso poderia influenciar em suas atuações com a camisa Coxa - Branca?
Alex: Não é fácil!!! Tenho feito uma cobrança muito grande em cima de mim mesmo, e preciso ter um cuidado quando cobro alguém no clube para que não eu não esteja agindo com o sentimento de torcedor. Tentar me manter equilibrado em minhas ações é o mais difícil, mas realmente tem sido extremamente prazeroso.
A sua parceria com o atacante Deivid foi responsável por vários gols, tanto no Cruzeiro, como no Fenerbahce. A torcida tem grande expectativa que ela também funcione no Coritiba. Qual sua expectativa em relação a isso?
Alex: Nenhuma! Nunca criei expectativa de nada nem em relação a mim, e muito menos com outros jogadores. O Deivid é um grande jogador, já provou isso em todos os clubes que passou. Vou apoiá-lo sempre para que renda bem e seja o goleador que sempre foi. E isto serve para todos os outros atletas. Minha expectativa é que tenhamos no coletivo nosso ponto forte, pois se isso acontecer, as individualidades aparecerão.
Você firmou um contrato de dois anos com o clube. Você encerra sua carreira como jogador em 2014, ou ainda existe a possibilidade de prorrogá-la?
Alex: Realmente não penso nisso. Penso em treinar bem na semana, desenvolver bem nos jogos e depois me recuperar pra recomeçar a semana. 2014 ainda está muito longe.
Na próxima sexta-feira, o "Falando de Bola" publicará a parte final da entrevista com o craque Alex.
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