Falando de Bola
Trinta e seis anos se passaram, mas me lembro como se fosse ontem. Nasci em uma família de Coxas. Pai, mãe e quatro filhos. Não existiu ali uma ovelha desgarrada que fosse torcer para algum outro time de Curitiba que não tivesse as cores verde e branca na camisa.
Era uma criança de nove anos todo orgulhosa pelo que o Coritiba vinha conseguindo na Taça Brasil de 1985. Estive em vários jogos naquele campeonato. Chorei na careta de Lela contra o Santos no gol marcado no último minuto e que classificou o Coxa. Achei o máximo o Couto Pereira todo escuro, mas iluminado pelos isqueiros contra o Atlético/MG. Assisti incrédulo pela televisão o milagre de Rafael nas semifinais em um Mineirão lotado.
A final contra o Bangu não tinha como dar errado pra gente. O título tinha que ser nosso.
Meu pai não quis ir pro Rio. Ele sabia que se ele fosse, eu teria que ir junto de qualquer maneira, e achou melhor não arriscar levar uma criança de apenas nove anos para um território hostil, lotados de banguenses, flamenguistas, botafoguenses, vascaínos e fluminenses torcendo pelo Bangu. Mesmo que o número de Coxas que foram pro Rio fosse grande, ficamos em casa. Só meu irmão mais velho foi e tem uma lembrança que nunca mais esquecerá.
Já que íamos ficar em casa, para me consolar, a minha mãe resolveu costurar uma enorme bandeira verde e branca. A promessa é que estaria pronta para o dia do jogo. Dito e feito, assim que começou o jogo lá estava eu assistindo enrolado no meu manto alviverde.
O jogo foi um nervosismo só. Não sei até hoje como meus pais aguentaram sem infartar. Acho que foi nesse dia que eu peguei o hábito de roer as unhas, que de vez em quando ainda acontece.
Meu grande herói naquele time era o folclórico Lela, mas naquela noite ganhamos um santo também: o São Rafael. O que esse cara pegou naquele dia não foi brincadeira. Só não pegou pênalti porque não precisou. Pois o Ado estava lá para mandar pra fora.
Jamais vou esquecer da lembrança de ver minha mãe ajoelhada na sala de casa em frente à televisão, rogando para Nossa Senhora do Perpétuo Socorro fechar o gol de Rafael nas cobranças de pênaltis. A santa, como em um sopro divino, deu apenas um sopro na bola quando Ado foi para cobrança, mandando ela para fora.
Quando Gomes mandou a bola para dentro do gol de Gilmar, a sala de casa virou uma grande festa, em um misto de sorrisos, choros, gritos, abraços, todos muito felizes com o primeiro título brasileiro de um time paranaense.
E tudo isso, que começou em julho, e terminou no primeiro dia do mês de agosto, mês do meu aniversário. Para quem fazia 10 anos apenas seis dias depois, foi um grande presente antecipado.
Não poderia ter ganho presente melhor. No dia seguinte, todo orgulhoso, eu desafiei as regras do colégio. Camisa do Coritiba por baixo do uniforme, como se fosse realmente a minha segunda pele. E por cima dele, eu desfilava feliz e cheio de orgulho, enrolado no meu manto alviverde. Não tinha para ninguém, naquele momento quem mandava no futebol brasileiro era o Coritiba Foot Ball Club.
A felicidade que aquele título me trouxe é algo que jamais esquecerei. Talvez explique todo o amor que sempre senti pelo Coritiba, pois o que aconteceu naquela noite de 31 de julho, varando a madrugada de 01 de agosto , é algo que nunca mais será esquecido.
E trinta e seis anos depois eu posso dizer a vocês: Eu vi meu time ser campeão brasileiro, algo que ficará marcado para sempre dentro de mim. E toda vez que me lembro deste título lembro o quanto o Coritiba me faz feliz, e sempre irei amá-lo cada vez mais, independente de resultados dentro de campo.
Saudações de um campeão brasileiro
Ricardo Honório
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