Futebol, Ciência e Opinião
Caros leitores,
Estive ontem acompanhando a apresentação em relação a venda da SAF que faz parte do processo para a assembléia de sócios em 31/05.
Como fomos obrigados a aderir um termo de confidencialidade (NDA) para participar do evento (o que entendo ser totalmente equivocado), algumas informações financeiras não poderei divulgar.
Em primeiro lugar gostaria de deixa claro que não sou contrário a SAF e muito menos a modernização administrativa, entretanto concluí que o modelo adotado não é o melhor para o futuro do Coritiba.
Acredito em uma SAF administrada pelo Coritiba, com cargos profissionais, gestão estratégica e principalmente METAS estabelecidas de desempenho. A venda do futebol profissional é um atestado de incompetência administrativa, pois poderíamos captar investimentos da mesma forma que está sendo proposto pelo fundo.
Nossas receitas não me parecem estar longe do que está sendo apresentado como investimento, principalmente com a formação da Nova Liga, que pode nos proporcionar cerca de R$ 120 milhões de reais já no primeiro ano. Estamos vendendo o futebol no momento de maior expectativa de aumento de receitas, temos cerca de 40 mil sócios adimplentes, uma marca forte para ser explorada. Poderíamos aguardar um pouco mais.
Venho acompanhando a veiculação na mídia que o Coritiba está no fundo do poço e só a SAF pode nos salvar. DISCORDO completamente, temos um estádio quitado na região mais valorizada da cidade, um centro de treinamento e outra área que pode ser construído um novo, 40 mil sócios adimplentes, dívidas negociadas a longo prazo, alguns atletas despontando das categorias de base com altos valores de mercado, receita recorde para o futebol e estamos na primeira divisão entre os maiores clubes do país.
Acredito que nossa situação de momento no campeonato brasileiro, que pode ser completamente revertida, pode influenciar na decisão do sócios, reforço que a proposta deve ser melhor analisada.
Nossa situação não é das melhores mas está controlada, acredito que essa operação poderia ser melhor avaliada.
Nossa dívida é uma das menores entre todos os clubes da primeira divisão, como comparativo nosso passivo já em recuperação gira em torno de 237 milhões, veja abaixo:
1- Atlético-MG – R$ 1,571 bilhão
2- Cruzeiro – R$ 1,053 bilhão
3- Corinthians – R$ 910,4 milhões
4- Palmeiras – 875,8 milhões
5- Internacional – R$ 865,7 milhões
6- Botafogo – R$ 729,5 milhões
7- Fluminense – R$ 677,5 milhões
8- Vasco – R$ 664,1 milhões
9- São Paulo – R$ 586,6 milhões
10- Santos – R$ 539,9 milhões
11- Grêmio – R$ 518,1 milhões
12- Red Bull Bragantino – R$ 301,1 milhões
13- Athletico-PR – R$ 285 milhões
14- Bahia – R$ 284,3 milhões
15- Flamengo – R$ 258,8 milhões
16- Coritiba – R$ 237,5 milhões
17- América-MG – R$ 122,5 milhões
18- Goiás – R$ 48,2 milhões
19- Ceará – R$ 38 milhões
20- Fortaleza – R$ 33,1 milhões
21- Atlético-GO – R$ 8,2 milhões
22- Cuiabá – R$ 2 milhões
Fonte:
Vale ressaltar que, quando os sócios foram convocados para criação da SAF ao final de 2021, lembro claramente que estava determinado que a associação Coritiba Foot Ball Club seria sempre majoritária, entretanto na apresentação de ontem o % de participação se mostrou divergente.
Ao final da apresentação tivemos informações do modelo de venda da SAF, papéis e responsabilidades, algumas informações sobre penalidades e investimentos obrigatórios. Ao final da explanação, segundo os responsáveis pelo evento, os sócios poderiam ter enviado perguntas para uma sessão gravada com a advogada do clube, algo que não recebi qualquer comunicado oficial. Várias perguntas foram respondidas no vídeo, sendo que cerca de 90% do mesmo autor.
Solicitei a palavra para realizar perguntas, afinal seria impossível elabora-las previamente sem assistir a apresentação, quando para minha surpresa fui informado que não poderia realizar pois deveriam ter sido enviadas antes, que um contrato com mais de 500 páginas estava disponível para os sócios, que eu deveria ter vindo fazer a leitura. Com todo respeito esse procedimento é um completo desrespeito com o sócio.
Questionei novamente que isso não seria o procedimento correto, pois para que pudéssemos tomar nossa decisão como sócio do clube deveríamos contar com a presença do jurídico nessa sessão para esclarecimento de dúvidas.
Foi quando os responsáveis (confesso que não me recordo os nomes) se propuseram a responder minhas perguntas. Solicitei prorrogação de prazo para envio ao clube, o que foi absolutamente negado. Nesse momento fiquei com a impressão que não existe interesse em responder indagações do associado.
Pontos que questionei, que não ferem o NDA, pois não eram fruto da apresentação.
1- A empresa que pretende adquirir a SAF pode ter outros clubes no Brasil e exterior ? Esse é um dos questionamento de outro clube do futebol brasileiro que se tornou SAF a pouco tempo, virou "ponte"para outro clube fora do país. A resposta foi que no Brasil não, mas no exterior sim.
2- Como será o processo de transferência de ativos para a o comprador (CT, por exemplo) ? Couto Pereira continua como ativo da Associação Coritiba, com uma concessão de uso com responsabilidade de investimento. CT será transferido para o comprador. É público que haverá responsabilidade um investimento em novo centro de treinamento. Vale deixar claro que esse novo CT não será do clube, mas do investidor, que tem um contrato por prazo determinado com clausula de renovação. Caso, por qualquer motivo, o contrato não seja renovado, o Coritiba Foot Ball Club fica sem nenhum CT, pois não está previsto reversibilidade dos bens. Outro fator importante é o valor de mercado do CT da Graciosa, uma área de 77 mil m2, muito próxima de uma das regiões mais valorizadas de Curitiba, o Alphaville. Fiz algumas pesquisas sobre o m2 no Alphaville, encontrei valores acima de 2 mil reais o m2. O investidor deve construir em novo CT que não pertencerá ao clube, recebe o CT da Graciosa e área de Campina Grande do Sul. Será que não é um negócio extremamente vantajoso ao investidor ?
3- Metas de desempenho. Questionei se estava previsto metas e indicadores de desempenho para o comprador. A resposta é NÃO. Apenas meta financeira, ou seja, aporte de dinheiro. Apesar de questionar vários pontos esse foi o mais preocupante, não existe nenhuma garantia contratual que o investidor será cobrado por desempenho, ou seja, a SAF pode contratar vários cabeças de bagre por milhões, cair para série D e focar em venda de jogadores de base. Não existe qualquer instrumento que projeta o Coritiba desse risco. Esse ponto por seria suficiente para me convencer que esse modelo é completamente inviável ao clube e ao torcedor, que espera alto desempenho no futebol.
4- Investimento mínimo anual. Achei muito baixo, comparando com os investimentos de clubes que ficaram entre os doze primeiros da serie A em 2022, estaremos atrás. Não acredito que esse modelo mudará o patamar do Coritiba. Está no balanço de 2022, que o Coritiba investiu 84,2 milhões de reais no futebol profissional e 7,9 milhões nas categorias de formação. Totalizando 92,1 milhões. O caixa com superavit ao final de 2022 foi de 60,7 milhões, entretanto com um empréstimo de 22 milhões. Dessa forma seu superavit real foi de 38,7 milhões. Considerando despesas administrativas, pagamento de dívidas, etc.
Será que o aporte anual do investidores é um bom negócio para o Coritiba ? Quem participou do encontro sabe os valores e considerando o que escrevi no início sobre a Nova Liga, fica a dúvida se os valores não são bons para o Coritiba.
Apenas como comparativo, em 2022 o Flamengo investiu mais de 1 bilhão no futebol. Quando estive realizando um projeto no SPFC em 2017, o clube já tinha um orçamento previsto para o futebol de 450 milhões de reais.
5- Pagamento das dívidas. Vale ressaltar que NÃO está previsto que a SAF assumirá as dívidas do clube, mas sim será responsável pelos pagamentos já negociados, com multas contratuais caso não o faça. Mas se não pagar, o clube terá que correr atrás do dinheiro ou perde a recuperação judicial. Achei absolutamente desproporcional, pois o maior risco continua sendo do clube. As dividas deveriam ser absorvidas pela SAF no momento do contrato, pois isso torna novamente desproporcional o risco.
6- Insolvência da SAF. Questionei sobre a insolvência a SAF, seja por qualquer motivo não só financeiro, se o futebol seria revertido ao clube. A resposta que NÃO. Dessa forma sobraria só a associação, apenas com o Couto Pereira.
Não foi apresentando Business Case da SAF, não temos a menor ideia do que será feito a partir da assinatura do contrato, qual a estratégia a curto, médio e longo prazo, resultados esperados, METAS DE DESEMPENHO, etc. Um completo vazio sobre o futuro do futebol do Coritiba.
Foram vários outros questionamentos na reunião, que por questões de confidencialidade não poderei escrever aqui.
Enfim, com a SAF vendida, deixamos de ter o Coritiba Foot Ball Club como associação de futebol, que tem como sua função primária vitórias e títulos.
Passamos para uma empresa que investe com o objetivo de obter lucro, sem obrigatoriedade de títulos, apenas aporte financeiro e após algum tempo pagar dividendos aos acionistas. O Coritiba que conhecemos hoje vai acabar, será um clube de dono, mas algumas possibilidades de veto da Associação Coritiba.
SAF deveria ser administrada pelo associação Coritiba Foot Ball Club, no modelo proposto meu time de coração vai ficar inativo.
Marcelo Algauer
A opinião dos colunistas não refletem, necessariamente, a opinião do site.
Cada colunista tem sua liberdade de expressão garantida e assinou um termo de uso desse espaço.
Para que a minha glória a ti cante louvores, e não se cale. Senhor, meu Deus, eu te louvarei para sempre. (Salmos 30:12)