Futebol: Razão x Emoção
"No estádio pode." Me peguei dizendo isso ao meu filho quando ele, desacostumado, escutou um senhor parecido com o avô xingar até a alma um desconhecido atleta do operário. Minutos depois não tive como explicar uma mulher xingando o Marcelo Cirino de tudo quanto é nome e ainda dizendo que ele era um fracassado, um perdedor por ser reserva de time do interior e torcendo pra que ele se contundisse ainda no aquecimento.
Pensei comigo: é brincadeira, claro, ou efeito do álcool, mas será que quero que ele ame e participe mesmo deste ambiente?
Tentei focar nas coisas boas do jogo. Nos gols daquela vitória coxa, no vira-lata caramelo, nas demais crianças. Na música.
Aí veio a canção:
"Comprei um pacotinho de loló e cocaína
Fiquei muito louquinho e apelei pra heroína
Depois da heroína veio o LSD
Aí veio um anjinho e me falou que ia morrer! cheirar loló, loló, loló, cheirar loló, maconha e pó."
Será que isso é menos pior do que chamar o homossexual de viado, ou o preto de negão? Ou será que o pessoal do politicamente correto não escuta e não entende os versos desta poesia?
Não pude deixar de lembrar da proibição de ingresso ao estádio dos membros da torcida, e achei engraçado ver os cantores desta ode ao excesso pedindo comedimento às autoridades e se sentindo agredidos e injustiçados por uma decisão judicial.
Eu não espero nada de bom do judiciário, stjd, muito menos do mistério público, porque penso serem órgãos dominados por pessoas que vivem fora da realidade de 98,3% das pessoas que são afetadas por suas decisões. Então, sim, a decisão de banir os membros da organizada do Estádio é tratar a uma espinha com quimioterapia.
Porém, não vejo na torcida o mesmo furor quando a punição afeta toda a comunidade de torcedores, como nos casos de jogos com portões fechados. Não vi tanta comoção e engajamento nas redes sociais, quando toda a torcida foi punida e obrigada a ir para Joinville ver os jogos. Agora que a punição afetou apenas a seus membros, todos se unem pela causa...por que?
Ao invés de ficar se escondendo atrás das teorias do sempre conveniente direito penal, a torcida deveria estar dizendo quais medidas está adotando para evitar maiores atos de violência.
O que foi feito desde 2009 para cá? Qual a grande campanha contra violência feita? Quando houve reuniões entre organizadas e times para acabar de vez com emboscadas em sedes e ataques a ônibus em estradas? Nunca! Se algo foi feito, claramente foi inútil, porque todas as torcidas, de todos os clubes, continuam sendo punidas por vândalos, que, diga-se: não são bandidos! São torcedores! A imensa maioria desses que causam o caos no domingo à tarde, pega ônibus cheio e deixa o filho na escola segunda pela manhã.
Se quem está na chuva é pra se molhar, então, arquem com as consequências das atitudes dos seus! Admitam que o ambiente das organizadas é violento. As canções são violentas. O clima é de culto ao ódio. Ou eu estou falando alguma mentira?
Não sejamos hipócritas!
A essa altura quem defende a torcida já me odeia, mesmo assim devo dizer que não generalizo. Sei de ações sociais bem legais e valorizo o trabalho abnegado que o pessoal da bateria, por exemplo, e outros setores da organizada fazem. Mas a verdade é que o trabalho desses é ofuscado pelos canalhas que também frequentam a instituição.
Infelizmente poucos têm coragem de falar a verdade sobre as organizadas. Muitos clubes defendem e até as adulam, recebendo seus dirigentes no CT, dando ingressos, entre outros absurdos.
A imprensa também tem muita culpa. Incita, fomenta a violência, a desconfiança e o ódio da torcida, e depois que a briga e a tragédia ocorrem, vem com aquela conversa mole de " precisamos de paz" e " são bandidos travestidos de torcedores".
Essa questão da violência nos estádios, infelizmente, como muitos outros problemas nesse país, não é tratada com seriedade pelas autoridades e não quer ser resolvida pelos clubes e pelas torcidas. Enfim, não há esforço real de ninguém para se chegar a uma solução.
Mas por que requentar essa marmita agora Schumak? Atletiba e Superbowl. O Clássico do centenário vem aí e eu me pergunto: quantos ônibus serão quebrados? Quantas mandíbulas partidas e olhos vazados? Será que a esdrúxula, porém merecida, punição vai nos fazer mais seguros?
Enquanto via a final do campeonato de futebol americano, comecei a escrever esse texto. Tudo lindo! Meticulosamente organizado, uma celebração do futebol, muito mais que dos dois clubes finalistas. Estádio moderno. Lotado. E, claro, com ambas as torcidas ocupando cada qual 50% das acomodações. Do lado de fora, paz e diversas atrações para todas as idades.
Os troféus e prêmios entregues ao longo da muito bem orquestrada cerimônia, todos com nomes de antigos atletas, de diferentes times.
Seria possível o Coxa branca aceitar receber o troféu Sicupira de melhor em campo? Não temos civilidade pra isso.
Será que o atleticano aceitaria e ficaria feliz de ter um atleta de seu time laureado com a medalha Dirceu Kruger de maior artilheiro? Eles não têm essa maturidade.
Seria possível a um colorado o recebimento do prêmio Ronaldinho Gaucho de maior assistente da competição? Mais fácil ver um Corinthiano cuspindo no troféu Ademir da Guia de gol mais bonito.
Assim como o país, a economia e a política, nós temos o futebol, as torcidas, o ministério público e as punições que merecemos.
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