Opinião, Polêmica e Conspiração
O texto abaixo me foi enviado pelo amigo e torcedor do Coxa, Dalmo Louzada.
É um texto escrito no blog FUTEQUIM por Emiliano Tolivia e vale a reflexão, podendo ser aplicada a qualquer momento.
Boa leitura!!
O torcedor brasileiro virou um chato
- Eu pago meu ingresso, tenho o direito de vaiar – decreta um amigo no Bar do Peixoto, na porta do Engenhão.
É verdade, pelas leis do consumidor, de fato tem. O "problema" é que o velho esporte bretão não é teatro nem cinema, por mais que esteja em curso a elitização dos estádios, a implementação do futebol moderno. Uma torcida sempre foi mais comunismo do que capitalismo, mais Marx e menos Adam Smith, sempre foi aquela catarse de pessoas de todas as classes unidas, em uníssono, empurrando seu time para a vitória independentemente das condições da arquibancada, do conforto, da alimentação, da segurança, do tempo.
É claro que o mundo mudou, a modernização das arenas é necessária, mas estamos virando comedores de cachorro-quente, reclamões, cheios de direitos sagrados porque adquirimos nosso bilhete. Uns torcedores de beisebol. Não podemos ser gado, mas também não devemos – porém, estamos – perdendo a essência da brincadeira. Eu quero mais Maracanã e menos Camp Nou.
Os estádios costumam ter espaço para todos os tipos de fãs. Cadeiras para torcedores calmos e áreas para as pessoas que preferem ficar em pé. O problema é quando o sujeito evoca seu sagrado status de consumidor de ópera para ficar no meio da bagunça e pedir "senta aí, abaixa a bandeira". O futebol não é um mundo à parte, onde tudo é permitido, mas certamente tem as suas particularidades – e que ninguém que vai a um jogo diga que nunca foi apresentado a elas.
Eu não sei se é porque o Brasil está finalmente entrando no rol das maiores economias do mundo, mas coincidentemente – ou não – estamos nos aproximando destes países em frieza na hora de empurrar o clube que, teoricamente, amamos. Sempre achei as torcidas brasileiras um passo atrás das demais sul-americanas, como as argentinas e uruguaias. Pois agora ficamos quase uma maratona para trás, de tantos passos de curupira que demos. Levamos baile de chilenos, equatorianos, peruanos, colombianos… Se procurar lá no Suriname, certeza que são melhores. Logo nós, que pretensamente enchemos a boca para dizer que não há torcida como a brasileira. Tem sim. A espanhola, a suíça, a dinamarquesa…
O exemplo – negativo – da semana aconteceu no jogo do Vasco. O time ganhou do Lanús e mesmo assim os vascaínos estavam mais preocupados, durante todo o segundo tempo, em vaiar o técnico Cristóvão Borges. Ok, concordo que não dá para trocar Felipe por Fellipe Bastos, mas passar 45 minutos apupando é enervar e atrapalhar seu próprio clube. É jogar contra, sim. Sem contar que foram apenas 13 mil pagantes em uma oitava de final de Libertadores…
- Ah, amigo, não aguenta pressão, não joga em time grande.
Os jogadores vão continuar no clube, ganharão seu salário normalmente. Mesmo que sejam eliminados da competição. E aí? É para isso que o sujeito sai de casa, pega condução ruim, passa aperto, paga ingresso? Para atrapalhar seu próprio time?
Cada vez mais vejo amigos incomodados com suas próprias torcidas. A do Fla, grande como é, tem apoiado em poucos momentos. Na do Flu, percebo muita gente reclamando e até vendo como antipática a postura de um grupo que apoia incondicionalmente durante os 90 minutos. São tratados como alienados. O mais curioso é que, na Bombonera, vi vários tricolores, que claramente são corneteiros, boquiabertos com a cantoria dos xeneizes mesmo após a derrota. "Olha lá, impressionante, os caras apoiam na derrota, sabem torcer". Por que não faz o mesmo aqui? Basta repetir. Mas não, o melhor é vaiar, fazer piada da própria desgraça e achar que o gramado do vizinho é sempre mais verde.
A Argentina é um exemplo positivo. A começar pela seleção. Lá, o povo ainda torce por ela, um jogo no Monumental é pedreira, há cantos de futebol. Já experimentou ir a uma partida da Seleção Brasileira? É torcida de vôlei, é outro clima. Até mais familiar, diga-se. Mas não é futebol. Eu senti profunda vergonha na Copa da Alemanha. Havia muitos brasileiros, mas o máximo que se ouvia era o detestável "Eu sou brasileiro, com muito orgulho, com muito amor". Música, aliás, copiada de uma versão hermana (!) para uma propaganda de chinelo (!!!).
Outra característica interessante dos argentinos é torcer por clubes menores, de bairro, e não só para os gigantes. Sem essa de dois times, de sou Flamengo e Bahia, Fluminense e Serra, Vasco e Ceará. Qualquer jogo de time pequeno, da segunda ou terceira divisão, tem dois, três, quatro mil pessoas, com bateria, barras, bandeiras e músicas próprias. Basta pesquisar. Platense, Chacarita, Nueva Chicago, Morón… Aqui no Rio, o América não consegue mais jogar para 300 pagantes. Em algum momento nos últimos anos, o brasileiro foi deixando pelo caminho a essência da palavra torcer. O sujeito parece muito mais preocupado em ir ao estádio para extravasar suas próprias frustrações do que para apoiar. O brasileiro está deixando de ser torcedor para ser um comemorador. Ele não faz mais parte do processo, apenas do fim – quando lhe é conveniente. O torcedor brasileiro virou um chato, um mala, um ranzinza.
- Que é isso, rapaz, aqui é o país do futebol – rebate meu amigo, com certo deboche.
Já foi mais. Estamos ficando tão familiarizados com a cultura americana que adotamos de vez a odiosa dualidade dos winners e losers. Queremos estar do lado vencedor – claro – mas sem gastar uma gota de suor, um pouquinho das nossas cordas vocais. O brasileiro gosta do seu clube, quer vê-lo vencer, mas o deixa de lado se ele perder, some dos estádios e vai ao cinema. Hoje, quem gosta de futebol é o argentino, o chileno, o uruguaio. O brasileiro gosta é de ganhar.
SAV
RODRIGO
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