Por trás da Notícia
Um dos princípios fundamentais do Direito é o da segurança jurídica. Por isso existem os preceitos da coisa julgada, do ato jurídico perfeito, irretroatividade da lei e direito adquirido.
Peço desculpas aos leitores por começar um post aqui nesse blog, no qual costumo primar pela informalidade, com termos "técnicos-jurídicos", mas como vou falar de algo ligado - razoavelmente - à minha profissão de advogado, preciso tentar situá-los da melhor forma.
Obviamente estou me referindo à punição que o STJD aplicou ao rival e ao Coritiba em decorrência de bombas atiradas entre as duas torcidas no clássico do último dia 19 de julho.
Existem dois aspectos importantes que devem ser ressaltados, que muita gente vem confundindo ao avaliar - superficialmente - o caso.
- o primeiro é o aspecto MORAL: levado em consideração pelo STJD (que jamais poderia partir pra essa análise, se pretende ser um tribunal minimamente sério) e por aqueles que defendem a punição dos clubes pelos atos dos vândalos.
- já o segundo é o aspecto LEGAL: no qual eu e, pelo que vi, o jurídico do clube temos nos embasado (mas pela falta de poder político do Coxa não vai prevalecer, lamentavelmente).
Apenas explicando, presumo que o clube vá por essa linha em função da declaração do responsável pelo jurídico do Coxa, Gustavo Nadalin, deu ao jornalista Thiago Araújo, da Gazeta do Povo: “Não sabemos o que esperar mais. Não vejo lógica no que fizeram com o Coritiba e temo porque es tão adotando praticamente a mesma punição dada ao Atlético, que era o mandante”.
Fica claríssimo na declaração dele que o clube está inconformado com a falta de segurança jurídica no "justiça" desportiva. E, falsos moralismos à parte, eu também estou.
Quem lê o CBJD - a falaciosa legislação que embasa em grande parte o direito desportivo, mas ainda assim é a regra que vale - vê que no artigo e parágrafos pelos quais o Coritiba e seu rival foram denunciados não preveem qualquer punição pelo que se viu na Baixada.
O artigo 213 prevê "Deixar de tomar providências capazes de prevenir e reprimir desordens em sua praça de desporto". Nesse item o rival até poderia ser punido, porque a segurança era responsabilidade deles, como mandantes, apesar de eu achar realmente complicado localizar bombas escondidas em sapatos, por exemplo, mas isso é outro assunto.
Já o parágrafo primeiro prevê "Incide nas mesmas penas a entidade que, dentro de sua praça de desporto, não prevenir e reprimir a sua invasão bem assim o lançamento de objeto no campo ou local da disputa do evento desportivo", enquanto o parágrafo segundo prevê que o clube visitante sofre a mesma pena.
Como se vê, não foi jogada bomba alguma no campo. "Local de disputa do evento desportivo" está ali para se referir a outros esportes, referindo-se a quadras, tatames, ciclovias ou sabe-se lá mais o quê. O caso, portanto, é de polícia, e não de justiça desportiva!
Não existe a mínima segurança jurídica quando há uma regra expressa e previamente exposta que não é aplicada adequadamente; não há qualquer fundamento LEGAL para que o Coritiba seja punido nesse caso. Se querem que um clube seja responsável pelos atos de seus torcedores, ainda que em outros estádios, que façam uma lei própria pra isso (ainda que absurda e falso-moralista), e não tentem criar factóides e estratagemas vergonhosos para tentar "dar exemplo" usando como bodes expiatórios dois clubes de fora do eixo.
Sem contar o absurdo de a situação acontecer no dia 19 e já no dia 24 estar sendo julgado. Como dito pelos advogados dos dois clubes na ocasião, isso não existe em lugar nenhum do mundo! É óbvio que existem interesses escusos por trás disso.
Por essas e outras a falácia, a piada, a vergonha que é a "justiça" desportiva vai caindo cada vez mais em desgraça e, enquanto engana uns e outros com decisões políticas, amorais e sensacionalistas, vai indignando cada vez mais aqueles que veem no direito uma ciência séria e de proteção ao cidadão. Lamentavelmente.
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